Robert Altman (1925 – 2006) é um cineasta pelo qual eu tenho
um respeito muito grande, muito mais pela sua influência do que pelos filmes em
si. Admito não ser fã de “Nashville (1975)”, embora goste de “MASH (1970)”, mas
também tenho sérios problemas com “Quando os Homens São Homens (1971)”, tido
por muitos (inclusive por profissionais que admiro) como uma obra-prima.
Mas independente do meu gosto pelas suas obras, o fato é que
ele sempre soube o que estava fazendo, e tinha a capacidade de se manter no
controle de sua narrativa mesmo em projetos que nas mãos de outros diretores
estariam fadados ao fracasso. E muito mais do que isso, sua influência e
importância inspiraram vários de meus diretores favoritos, destaque para Paul
Thomas Anderson que em sua obra-prima “Magnólia (1999)” fez várias referências
diretas à obra do Altman, e qualquer diretor que tenha influenciado, ainda que
levemente, este que é um dos meus filmes preferidos, tem o meu respeito
inquestionável.
Assassinato em Gosford Park se passa em uma casa de campo,
onde vários membros da alta sociedade britânica, junto com seus serviçais, se
reúnem para uma festa de fim de semana, e eventualmente, como o título
brasileiro faz questão de adiantar, um assassinato acontece e todos viram suspeitos.
É fácil ler a sinopse do filme, ou apenas ouvir seu título
traduzido (o nome original é apenas Gosford Park) e presumir que se trata de um
típico suspense policial, onde todos os personagens são suspeitos e no fim o
culpado é o menos provável deles.
Mas não se engane, o assassinato só acontece após metade do
filme ter se passado, e mesmo quando ocorre não tem tanta importância assim. O
filme é muito mais sobre os personagens e sobre a frágil camada de elegância
que serve para esconder a podridão dentro deles. Nisto, é impossível não
compará-lo ao excelente “Festa de Família (1998)” (foto ao lado), de Thomas Vinterberg, o
filme que deu início ao Dogma 95 na Dinamarca, e tinha uma proposta similar.
Os inúmeros personagens de Gosford Park são muito bem
desenvolvidos, e Altman consegue transitar pelos seus conflitos com total
controle, como já havia demonstrado em vários de seus filmes anteriores. Mas
ainda assim, o fato é que o número de personagens é muito alto, e por mais que
sejam todos complexos, fica impossível se importar com seus destinos e escolhas,
pois não conseguem gerar nenhuma empatia. E isso dá origem ao que é meu maior
problema com o Altman: a frieza excessiva.
Eu não tenho problema nenhum com filmes frios, inclusive
muitos de meus títulos preferidos têm a frieza como uma das características
principais. Além disso, o já citado “Magnólia (1999)” tem como um dos fortes a
capacidade de desenvolver simultaneamente um grande número de personagens. Mas
Altman faz isso de uma maneira que chegou um ponto do filme em que eu já não
estava me importando nem um pouco em relação ao que poderia acontecer com
alguém, e nem me perguntando quem cometeu o crime e por quê.
Isso também me afetou muito em seus filmes anteriores. Em
“Nashville (1975)”, eu passei duas horas e meia admirando a capacidade do filme
de passar para o espectador o clima e o contexto em que vivem os personagens,
mas sem conseguir sentir qualquer outra emoção. O mesmo vale para “Quando os
Homens São Homens (1971)”, que tem uma trilha sonora incrível e um clima
interessantíssimo e dificílimo de ser criado, mas que também não consegue
causar o mínimo envolvimento emocional com a trama ou os personagens, o que é
uma pena.
A primeira metade do filme se dedica basicamente à
construção do clima e ao desenvolvimento e apresentação dos personagens. Já na
segunda metade (após o assassinato), a trama vira um suspense policial clássico
de “encontrar o assassino”, mas sempre funcionando dentro do contexto e das
regras criadas pela primeira parte.
Nenhuma das duas metades é particularmente marcante. A
primeira se prejudica pelo excesso de personagens, ainda que a narrativa seja
bem conduzida, enquanto a segunda é menos interessante do que qualquer trama
policial deveria ser, ainda que traga um ou outro bom
momento.
Como um todo, Assassinato em Gosford Park é um bom filme,
mas excessivamente frio, que se prejudica pelo seu excesso de personagens ainda
que se preocupe em criar um cuidadoso clima.
É uma obra que pode ser admirada, mas em nenhum momento sentida.
O.K |
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