Deadpool é um
filme hilário. Não deixa de ter seus clichês e uma trama batida, mas traz um
personagem principal que é sensacional e surpreende por conseguir fazer pelo
menos 90% de suas piadas funcionarem.
O roteiro escrito por Rhett Reese e Paul Wernick (Zumbilândia) acompanha Wade Wilson (Ryan
Reynolds), um ex mercenário que é diagnosticado com câncer terminal, mas que
encontra a possibilidade de cura em um estranho experimento científico. Após o
processo deforma-lo e deixa-lo com poderes de cura, ele jura vingança contra o
responsável (Ed Skrein).
Auto referencial e debochado desde seus segundos iniciais, o
filme acaba se prejudicando pelo fato de ter um diretor inexperiente no
comando. Não que Tim Miller seja um mal profissional, pelo contrário, mas sua
falta de experiência fica óbvia principalmente nas sequências de ação, onde o
uso do bullet time é repetitivo e até
mesmo a violência mais gráfica (uma vantagem da censura alta) é utilizada de
maneira apenas O.K (os momentos mais interessantes já estavam nos trailers,
como aquele que traz Deadpool decapitando um personagem e chutando sua cabeça
em seus companheiros). Mas levando em consideração que é o roteiro que
diferencia o filme, isso acaba sendo um problema bem menor.
E o roteiro não decepciona. Mesmo tendo uma estrutura bem
convencional (embora brinque um pouco com a cronologia) e uma trama
completamente previsível, o texto consegue cumprir muito bem seu papel ao
construir um protagonista que transborda carisma (e os responsáveis pelos
efeitos visuais também merecem créditos por deixarem o personagem expressivo
mesmo com a máscara) e manter uma impressionante consistência em seus alívios
cômicos, que surgem de maneira orgânica e convincente – afinal, a dinâmica
entre os atores também funciona muito bem.
E são justamente esses alívios cômicos que fazem do filme
uma experiência tão divertida. Suas referências vão desde outros atores
(destaque para o momento que envolve Liam Nesson e a franquia Busca Implacável e outro sobre o rosto
de Hugh Jackman no terceiro ato), passando por outros filmes de super-herói (a
piada sobre as linhas temporais da série X-Men
e aquela que ironiza a participação frustrada do Deadpoll no X-Men Origens Wolverine são hilárias) e
até mesmo outros filmes aleatórios – algumas vezes de maneira mais óbvia (como
aquela que envolve o filme 127 Horas)
e outras bem mais sutis e que podem até passar despercebidas (como a leve referência
ao Cavaleiro Negro do Monty Python em
Busca do Cálice Sagrado).
É claro que tem alguns momentos em que o filme exagera na
auto referência e acaba chamando demais a atenção para a forma e deixando um
pouco de lado o conteúdo – como ao trazer o protagonista dizendo para outro
personagem: “Você acha que o Ryan Reynolds chegou onde está por causa do
talento?” e ao fazer uma quebra da quarta parede dentro de outra quebra de
quarta parede apenas para chamar atenção. A piada que encerra a projeção também
não tem nada de original (já tendo sido utilizada até mesmo no recente Anjos da Lei), mas pelo menos é
eficiente. Mas esses momentos são exceções, e passam longe de estragar o filme.
Aliás, vale dizer que a quebra da quarta parede (quando o
personagem olha para a câmera e fala com o público) é utilizada de maneira
muito eficiente e contribui para criar um vínculo maior entre o protagonista e
o espectador – o que se mostra fundamental para a força do filme.
Mas mesmo com o ótimo roteiro, com certeza o filme não
funcionaria tão bem se não fosse pelo seu ótimo elenco. Ryan Reynolds é possivelmente
o principal responsável pela força da narrativa, surgindo à vontade do primeiro
ao último segundo, tendo um timing cômico impecável e convencendo ao mesmo
tempo em que consegue se divertir imensamente.
Já a atriz brasileira Morena Baccarin, que faz a namorada do
herói (ou melhor, “herói”), funciona para humanizar o protagonista, além de ter
um indiscutível carisma e dar uma bela fragilidade para sua personagem (ainda
que o roteiro se renda ao velho e ultrapassado clichê de “mocinha em perigo” em
seu terceiro ato).
E se Ed Skrein pouco pode fazer com o vilão unidimensional e
caricato (mas que pelo menos funciona como apoio para ótimas tiradas do
protagonista), T. J. Miller pode se divertir com seu personagem, e Karan Soni
surpreende muito com uma participação que basicamente se resume a duas cenas,
mas que traz um dos momentos mais engraçados do longa.
Mesmo se prejudicando pelo fato de já ter sido feito
pensando em continuações, Deadpool
não tem uma estrutura ou uma trama particularmente originais, mas pelo menos
consegue brincar com seus próprios clichês e funcionar perfeitamente bem como
uma comédia. Pode não ser um dos melhores filmes do ano, mas com certeza será
um dos mais divertidos.
Bom! |
João Vitor, 11 de Fevereiro de 2016.
Crítica originalmente publicada no site Pipoca Radioativa: http://pipocaradioativa.com.br/