O Jogo da Imitação
Roteiro pavoroso estraga o que seria uma interessante biografia
Alan Turing foi um grande matemático inglês, considerado o
pai da computação moderna, que ajudou a decifrar os códigos de guerra nazistas
e acabar com a Segunda Guerra. Além disso, passou parte de sua vida tentando se
“curar” de sua homossexualidade, chegando a cometer suicídio em 1954. Dessa
forma, é de se esperar que um filme baseado em sua vida tenda a ser, no mínimo,
interessante, deixando espaço para um estudo de personagem e uma trama
marcante. Infelizmente, esse não é o caso de O Jogo Da Imitação, novo
longa-metragem do diretor Morten Tyldum, já que se trata de um filme
esquecível, recheado de clichês, e que se sustenta apenas pelo talento de seus
atores e pela sua curiosa premissa.
Baseado no livro Alan Turing: The Enigma, de Andrew Hodges,
o filme mostra os esforços do matemático inglês (interpretado por Benedict
Cumberbatch) para quebrar o código de guerra nazista e acabar com a Segunda
Guerra, intercalando com alguns flashbacks mostrando a sua juventude, quando
começou a se interessar por criptografia.
O roteiro de Graham Moore é extremamente burocrático e nada
sutil, construindo personagens não convincentes e transformando até seu forte
protagonista em uma caricatura. Em meu texto sobre A Teoria de Tudo (que pode
ser lido aqui) elogiei o fato de o filme não tratar Stephen Hawking como um
gênio inigualável, e mostrar de maneira convincente seus esforços, e mesmo que
não entendamos seu raciocínio, suas façanhas soavam plausíveis. O mesmo não
ocorre com O Jogo da Imitação, já que as conclusões de Alan sempre são bruscas
ou mal justificadas, e para piorar, somos constantemente obrigados a ouvir
clichês como “Tenho a impressão de que você vai ser bom nisso”, “Minha máquina
irá vencer a guerra!” ou “Se você o demitir terá que nos demitir também”.
Os flashbacks envolvendo a juventude de Alan também falham
ao tentar incluir peso dramático à narrativa, já que em nenhum momento
conseguem criar um vínculo com o espectador, aparecendo de maneira quase
aleatória durante o filme, soando mais como um melodrama dispensável, e
esticando desnecessariamente a projeção. Para piorar, a interpretação de Alex
Lawther, que faz o protagonista jovem, parece muito mais uma imitação de
Benedict Cumberbatch do que uma versão menos madura do personagem.
A direção de Morten Tyldum é extremamente vazia e sem
personalidade, se limitando a simplesmente ilustrar o (fraco) roteiro e
confiando apenas no talento de seus atores para sustentar o filme. A única
exceção é quando cria uma rima visual envolvendo as engrenagens da máquina de
Alan e as rodas de um tanque de guerra, mas só.
As atuações merecem créditos por fazerem o possível contra
os clichês do roteiro, destaque para Benedict Cumberbatch, que mesmo sendo
obrigado a proferir falas quase vergonhosas, consegue fazer com que os
conflitos de seu personagem soem reais. Keira Knightley também está bem,
vivendo sua personagem com dedicação e a transformando em uma figura agradável,
mas nada que justifique sua indicação ao Oscar.
Mas se tem algo em que O Jogo da Imitação acerta, é em sua
reconstrução de época. Mesmo que o design de produção apele para alguns
clichês, como a parede coberta de anotações pregadas, também merece destaque
por criar ambientes convincentes, especialmente os pubs e o interior das casas,
e incluir ótimos figurinos, que acertam por serem discretos, mas ao mesmo tempo
comentarem sobre os personagens: Cumberbatch está sempre com peças cinza ou
escuras, já Knightley sempre possui uma peça de cor viva, como o azul ou
vermelho, já que se trata de uma personagem muito mais alegre do que o
protagonista.
Possuindo ainda uma trilha sonora horrível (que acaba por
evidenciar ainda mais a fraqueza do roteiro ao tentar, em vão, criar músicas
empolgantes para acompanhar os feitos dos heróis, e melodias emocionantes para
as cenas mais emotivas), O Jogo da Imitação se mostra uma experiência que se
salva do fracasso apenas pelo talento de seus intérpretes e a força de sua
história, mas falha ao povoa-la com personagens irreais e um protagonista
caricatural que poderia ter sido marcante se não fosse o péssimo roteiro e a
direção inexpressiva. No fim, ler a sinopse do filme causa mais emoção do que
assisti-lo.
Regular. |
João Vitor, 18 de Janeiro de 2015.