sábado, 10 de outubro de 2015

Crítica: A Travessia, de Robert Zemeckis



A Travessia

Mais um acerto de Robert Zemeckis


Robert Zemeckis já deixou sua marca na história do cinema, sendo um cineasta com uma capacidade invejável de criar narrativas únicas e envolventes, sempre buscando maneiras novas de contar suas histórias, e utilizando a tecnologia em favor da Arte (Trilogia De Volta Para o Futuro e Forrest Gump estão aí para comprovar). E sua carreira acaba de ganha mais um admirável exemplar com esse novo “A Travessia”.

O filme conta a história real do equilibrista Philippe Petit (Joseph Gordon-Levitt), que ficou famoso ao atravessar as Torres Gêmeas usando apenas um cabo. Mesmo sem ter autorização legal para a arriscada aventura, ele reuniu um grupo de assistentes internacionais e contou com a ajuda de um mentor (Ben Kingsley) para bolar o plano, que sofreu diversos obstáculos para poder ser finalmente executado. A travessia ocorreu na ilegalidade em 7 de agosto de 1974 e ganhou destaque no mundo inteiro.

Uma discreta referência
ao Laranja Mecânica.
Filmes americanos que se passam em outros países com personagens de outras nacionalidades sempre se veem diante de um problema: o idioma. Pois fazer um filme em uma língua que não seja o inglês implicaria em uma baixa de bilheteria, tendo em vista que uma boa parte do grande público americano não está acostumada a ler legendas. Sendo assim, filmes como “Operação Valquíria” e “A Menina que Roubava Livros” acabam se prejudicando e soando artificiais ao trazerem personagens falando uma língua que visivelmente não seria a deles. Aqui, o mesmo quase acontece, pois os personagens franceses falam inglês até mesmo entre si, mas pelo menos o roteiro se preocupa em tentar justificar essa decisão: Philippe Petit pede a seus amigos para conversarem em inglês porque ele precisa “treinar” para quando for à Nova York. Não deixa de ser um pouco artificial, mas pelo menos é necessário reconhecer o esforço.

O protagonista, muito bem interpretado por Joseph Gordon-Levitt, é carismático e bem desenvolvido, sem nunca fazer o espectador duvidar que alguém realmente possa ser assim (um erro muito comum em filmes que acompanham artistas emblemáticos), e seu romance com a personagem interpretada por Charlotte Le Bon traz momentos interessantes ainda que se encerre de maneira pouco satisfatória.


É preciso reconhecer também que o roteiro tem vários clichês: o pai de Petit é a caricatura do homem sério que não quer que o filho seja artista, e a cena que leva o jovem a sair de casa é de dar vergonha alheia, tamanha a artificialidade. Além disso, os dois últimos “cúmplices” a se juntarem ao grupo reunido pelo protagonista são a mais pura caricatura dos hippies dos anos 70. 

Já os efeitos visuais são impecáveis (Joseph Gordon-Levitt realmente parece estar andando pelo cabo em todas as cenas do filme e a reconstrução das torres por computação gráfica jamais soa artificial).




Como diretor, Robert Zemeckis cria um interessante clima de deslumbramento e reverência à Arte, que lembra um pouco o clima fantasioso criado por ele em O Expresso Polar, e sua escolha por praticamente não manter a câmera parada, utilizando a tecnologia para criar movimentos que de outra forma seriam impossíveis, não só ajudam a criar uma narrativa em 3D interessante (coisa rara), mas também contribui para o clima de deslumbramento do filme (não dá para esquece que acima de tudo, atravessar as torres gêmeas foi para Petit a realização de seu maior sonho).

E por falar em 3D, esta é uma das poucas vezes que eu diria que vale a pena pagar o ingresso mais caro, pois a técnica aqui ajuda na imersão do espectador na narrativa, especialmente durante a esperada cena da travessia entre as torres, onde acaba sendo fundamental para criar a tensão e sensação de vertigem que o cineasta almeja.


A trilha sonora acerta ao apostar em riffs de guitarra durante as passagens do filme que acompanham os planos dos personagens para “invadir” as torres, pois não apenas gera empolgação e divertimento, como também remete às bandas de rock dos anos 70 (período em que se passa o filme). E a escolha de Für Elise (a famosa musiquinha do gás), de Beethoven, para acompanhar a travessia é linda e ajuda a passar não apenas a leveza do momento, como também o deslumbramento experimentado por todos que acompanharam a façanha.

A opção de quebra da quarta parede (quanto um personagem olha para a câmera e fala diretamente com o público) para a narração do filme parece um pouco esquisita no início, e mesmo não se justificando, pelo menos consegue, conforme a narrativa avança, criar um elo entre o protagonista e o espectador, algo que acaba contribuindo para o impacto dramático da obra.


Terminando com uma palavra que é perfeita para resumir o legado deixado pelo ato de Petit e também fazer uma singela e discreta homenagem ao World Trade Center, “A Travessia” é um filme único, inesquecível, e mesmo com seus problemas, pode facilmente ser considerado como mais um passo certeiro na rica carreira de Robert Zemeckis.

Muito Bom!

João Vitor, 10 de Outubro de 2015. 

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