“A Bruxa” é um ótimo filme, mas que com certeza vai
desagradar todos que vão ao cinema em busca de um filme terror convencional e
genérico apenas para sentir medo e tomar sustos.
Ambientado na Nova Inglaterra, em 1630, o filme acompanha
uma família (pai, mãe e cinco filhos) que, após serem expulsos de sua
comunidade devido à seu fundamentalismo religioso, se mudam para um lugar
isolado à beira da floresta. E após seu filho recém-nascido desaparecer
misteriosamente, surge a suspeita de que existe uma bruxa por perto.
Mas ao contrário do que pode parecer pela premissa, o filme
se mostra muito mais interessado em criar uma clima de desconforto e
inquietação do que em cenas de terror mais gráficas e sustos fáceis.
E é justamente ao focar em seus personagens que o filme
encontra sua força. Apostando em uma narrativa lenta, com uma fotografia
completamente desprovida de saturação, e uma ausência quase completa de trilha
instrumental, o diretor estreante em longas Robert Eggers demostra um incrível
controle sobre seu universo. Sem nunca apelar para um jogo de câmera mais
estilizado ou sequências de ação grandiosas, o diretor mantém o espectador
interessado através de minimalismos e sutilezas (reparem como os olhares dos
personagens acabam dizendo muito mais do que os diálogos em si), deixando as
sequências tensas surgirem de maneira natural (como aquela que se passa à noite
em um estábulo, no terceiro ato da projeção).
As excelentes atuações também se mostram de fundamental
importância para o funcionamento do filme. Kate Dickie convence como uma mulher
que tem qualquer resquício de felicidade arrancada após a perda do filho,
enquanto Ralph Ineson usa sua rigidez com os costumes cristãos como uma
tentativa de esconder sua dor (e a cena que o traz falando para seu filho mais
velho que “os lobos ou a fome já o levaram” representa um dos momentos mais
memoráveis da narrativa).
Já Anya Taylor-Joy é possivelmente a maior surpresa do
elenco. Protagonizando o filme com segurança, a jovem atriz passa com muita
sutileza não só o sentimento de culpa de sua personagem (afinal, o bebê estava
em seus cuidados quando desapareceu) como também sua inquietação diante dos
rígidos hábitos religiosos de sua família (e não é à toa que uma de suas
primeira cenas a traga se confessando pelo pecado de “quebrar os mandamentos em
pensamento”).
Não que o filme seja perfeito, pois não é. Como muitas
outras obras que dependem muito do suspense (até o recente “Ex Machina” serve
de exemplo), a narrativa perde um pouco de sua força ao finalmente revelar suas
cartas e deixar o espectador entender tudo o que está acontecendo. É claro que
isso de certa forma é um mal necessário, e também é preciso admitir que o
desfecho da trama é bem redondinho, mas não tem como negar que o suspense era
muito mais eficiente.
Sem basear seu terror em sons altos inesperados ou monstros
assustadores criados por computação gráfica, “A Bruxa” é um filme que pode
desagradar quem quer um filme para perder o sono ou pular na cadeira, mas vai
agradar muito qualquer um que esteja à procura de um filme diferenciado, que se
preocupa muito mais com sua atmosfera e seus personagens do que qualquer outra
coisa. E qualquer filme que se mostre interessado em criar algo realmente
original merece atenção.
Muito Bom! |
João Vitor, 4 de Março de 2016.
Crítica originalmente publicada no site Pipoca Radioativa: http://pipocaradioativa.com.br/
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