A primeira imagem que vemos em Loveless é uma paisagem toda coberta de neve. Alguns segundos
depois, acompanhamos um personagem andando no meio de diversos galhos
ressecados. São duas imagens que servem de síntese de um filme que ao longo das
duas horas seguintes parece disposto a ir sempre para o caminho mais cruel, com
personagens frios e secos.
Ambientado na Rússia atual, o filme conta a história de um
casal que está prestes a se divorciar e entregar seu filho de 12 anos para um
orfanato. Ao descobrir isso, o menino desaparece sem deixar rastros e eles têm
que lidar com suas responsabilidades e egoísmos.
Este é um filme que odeia os seus personagens. É como se a
própria narrativa tivesse nojo das figuras que retrata. A câmera é cúmplice de
seus atos, mas também os julga e acusa. E até mesmo as cenas de sexo explícitas
são filmadas com distanciamento e parecem não trazer alívio ou prazer nenhum
para os envolvidos.
A fotografia de cores frias reforça o distanciamento e o
julgamento do filme, que também não deixa de comentar sobre seu próprio país (a
referência à Stalin e a cena que traz uma personagem correndo em uma esteira
com uma jaqueta com a bandeira russa são especialmente significativas).
Ambientado em um mundo acostumado com respostas rápidas do
Google, e onde as fotos postadas em redes sociais parecem ter mais importância
do que os fatos em si (repare na insistência de uma personagem em tirar fotos
superficiais de tudo), o filme ainda encontra momentos de surpreendente
delicadeza, como quando vemos crianças brincando em um parque e logo em seguida
percebemos que estamos vendo isso através de uma janela fechada, atrás da qual
se encontra um personagem privado de qualquer tipo possível de felicidade.
Sendo brutal com as figuras que acompanha, mas demonstrando
uma grande dose de empatia quando necessário, Loveless é um filme repulsivo, cheio de personagens irreparáveis e
condenados em uma sociedade fria e sem rumo. É uma experiência densa e difícil,
além de nada agradável. Mas como sua proposta é justamente incomodar, se mostra
incrivelmente eficiente e inesquecível.
Ótimo! |
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