“A Grande Aposta” é o “Trapaça” (2013) desse ano. Um filme que tem
várias qualidades e vários defeitos, mas que por ter um elenco admirável e
querido vai conseguir diversas indicações ao Oscar, tendo em vista que a maior
parte da Academia é formada por atores e eles normalmente valorizam esse tipo
de trabalho.
Michael Burry (Christian Bale) é o
dono de uma empresa de médio porte, que decide investir muito dinheiro do fundo
que coordena ao apostar que o sistema imobiliário nos Estados Unidos irá
quebrar em breve. Tal decisão gera complicações junto aos investidores, já que
nunca antes alguém havia apostado contra o sistema e levado vantagem. Ao saber
destes investimentos, o corretor Jared Vennett (Ryan Gosling) percebe a
oportunidade e passa a oferecê-la a seus clientes. Um deles é Mark Baum (Steve
Carell), o dono de uma corretora que enfrenta problemas pessoais desde que seu
irmão se suicidou. Paralelamente, dois iniciantes na Bolsa de Valores percebem
que podem ganhar muito dinheiro ao apostar na crise imobiliária e, para tanto,
pedem ajuda a um guru de Wall Street, Ben Rickert (Brad Pitt), que vive
recluso.
O primeiro obstáculo que o roteiro
tem que enfrentar é o excesso de exposição. Ao lidar com diversos termos
técnicos, e uma trama obviamente complexa, é inevitável que o texto traga
diversos momentos de explicação, pois o espectador tem que ao menos tentar
acompanhar o que está acontecendo. E as saídas que os roteiristas acham para
“contornar” esse problema são, ainda que exageradas, admiráveis.
Ao invés de trazer personagens
conversando sobre determinado assunto para que o espectador “descubra” o que
precisa saber, o que sempre soa artificial, o roteiro aposta em escolhas mais
peculiares, como a quebra da quarta parede (quando um personagem fala
diretamente com o espectador), trazendo muitas vezes participações especiais de
atores que entram apenas para explicar determinada palavra ou expressão (e o
momento envolvendo uma banheira é particularmente criativo, e o que envolve um
asiático é hilário). Isso não impede o roteiro de ter um excesso de exposição,
mas tendo em vista que isso era inevitável (afinal, estamos falando de
economia) dá para perdoar.
A direção de Adam McKay mantém a
câmera em constante movimento, e a montagem aposta em diversos cortes rápidos,
o que cria um ritmo acelerado que por mais que seja confuso, consegue passar o
contexto vivido pelos personagens. Já a trilha sonora, que vai de Nirvana a
Metallica, é excelente, lembrando até um pouco o jeito do Scorsese de usar a
música em seus filmes.
Como a trama é praticamente
impossível de se acompanhar (apesar das constantes explicações), o filme acaba
apostando em seu ritmo particular e o carisma de seu elenco para se sustentar.
Elenco, aliás, que traz diversos nomes de peso, entre eles Steve Carell, Marisa
Tomei, Christian Bale, Ryan Gosling, Brad Pitt e Melissa Leo.
Steve Carell surge aqui como uma versão menos bem humorada e bem mais revoltada de seu personagem mais famoso (Michael Scott, da série The
Office), o que não chega a ser um problema. Já Christian Bale, que foi indicado
ao SAG (e que tem alguma chance no Oscar) está muito bem e se diverte com a
excentricidade de seu personagem, ainda que seu reutilize alguns trejeitos que já havia criado em “O Vencedor” (2010).
Mas mesmo com um elenco admirável e
diversas ideias inspiradas, a narrativa se torna desinteressante e aborrecida
em diversos momentos. Afinal, não importa o quão bom seja a Forma, com um
Conteúdo fraco, não se faz um bom filme.
Além de confuso (que mesmo
proposital, impede um envolvimento maior por parte do espectador), o roteiro
ainda tenta sem sucesso adicionar uma complexidade dramática à seus
personagens, o que soa artificial e destoa com o resto da narrativa. Por
exemplo, o fato do irmão do personagem do Steve Carrel ter cometido suicídio
não desempenha papel nenhum na trama, e o monólogo do personagem do Christian
Bale no terceiro ato sobre como ele tinha dificuldades de encontrar uma esposa,
além de ser desnecessário, adiciona ao filme um pequeno problema de tom.
Acertando em cheio em seus minutos
final, ao ironizar de maneira inspiradíssima a impunidade dos banqueiros e
executivos milionários, “A Grande Aposta” acaba sendo um trabalho atípico e até
bem criativo, mas que falha em sua longa duração e seu tom irregular, surgindo
com um dos nomes mais fracos dessa temporada de premiações.
O. K. |
João Vitor, 9 de Janeiro de 2015.
Crítica originalmente publicada no site Pipoca Radioativa: http://pipocaradioativa.com.br/