quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Crítica: Deixe-me Entrar, de Matt Reeves

Remakes americanos de filmes estrangeiros costumam ser desnecessários (“Oldboy”, “Vanilla Sky” e o recente “Olhos da Justiça” servem de exemplos), e isso se deve ao fato do remake quase sempre ser pensado visando o sucesso comercial, fazendo com que sutilezas do original se percam no medo da censura e na necessidade de “mastigar” cada detalhe para ninguém sair da sala de cinema sem entender algo.

Sabendo disso, e tendo em vista que o sueco “Deixa Ela Entrar” (Tomas Alfredson, 2008) se diferenciava pela sua sutileza e pela sua visão madura sobre pré-adolescentes, é de se temer que seu remake americano acabasse deixando de lado sutilezas para se vender ao público jovem (que certamente seria atraído pela idade dos atores), ou então acabasse indo para o lado sombrio da obra, fazendo um filme de terror mais gráfico e assustador (afinal, trata-se de uma história com vampiro).

Felizmente, o que acontece neste “Deixe-me Entrar” (Matt Reeves, 2010) não é nenhuma das opções acima, pois o diretor (que já havia feito o incrivelmente competente “Cloverfield”, e que recentemente fez o excelente “Planeta dos Macacos: O Confronto”) compreende que a força da obra está nos conflitos de seus personagens, e que muito antes de ser um Terror, o filme é um Drama, e assim cria uma obra diferenciada que é fiel ao original, mas traz suficientes elementos próprios para não parecer completamente desnecessária.

A trama segue o jovem de 12 anos, Owen (Kodi Smit-McPhee), que sofre bullying no colégio e é praticamente ignorado pelos pais que acabaram de se divorciar, mas encontra uma peculiar amizade em Abby (Chloë Grace Moretz), uma estranha jovem que se muda em seu prédio.

Ao contrário do que possa parecer com a sinopse, o filme está longe de ser um romance. O que Matt Reeves faz é criar uma atmosfera intimista absolutamente melancólica, mergulhando o espectador nas tristezas e anseios que assolam o protagonista, e trazendo um “interesse amoroso” não como uma luz para trazer felicidade à sua vida, mas como apenas um leve conforto para escapar de sua realidade, mas que com certeza resultará em sofrimento (coisa que o filme em momento algum parece negar).


Sofrimento, aliás, que não é nem um pouco “amaciado” para baixar a censura. O Bullying sofrido por Owen surge como um verdadeiro terrorismo psicológico e muitas vezes também físico, o que é de essencial importância para o funcionamento do personagem, já que é um dos pilares que sustentam sua psicopatia em potencial (algo que fica claro na cena que traz o personagem enfrentando seus agressores em um lago congelado).


Mas deve-se admitir que falta ao filme algumas sutilezas, principalmente se compararmos com a versão sueca. Por exemplo, a relação da Abby com o homem mais velho que se passa por seu pai é muito mais fascinante no original, justamente por ser sutil e deixar o espectador pensar por si só e descobrir a origem do relacionamento entre eles. Já no remake, não só a relação é menos interessante, como também o roteiro faz questão de escancarar tudo o que o espectador poderia descobrir sozinho, ao incluir uma cena descartável que envolve o protagonista descobrindo uma certa foto antiga.

Os efeitos visuais em excesso também são um leve problema, pois acabam deixando algumas cenas mais artificiais do que o necessário (não vou comentar mais para evitar spoilers), mas é interessante também notar como até isso acaba ficando no segundo plano, já que muito mais do que a ação em si, o que importa é o que ela representa para os personagens (leve spoiler a seguir: a cena que traz Abby atacando uma personagem por pura necessidade desesperada é particularmente memorável).

Já o famoso momento da piscina, que representa o clímax da narrativa, também acaba se mostrando decepcionante, pois Reeves, compreensivelmente tentando fugir da imitação do original, acaba criando uma cena que começa sensacional, mas que termina de maneira rápida demais e perde toda a “beleza” (você entenderá as aspas quando vir o filme) que tanto diferenciava a obra sueca.

Mas mesmo com seus problemas, “Deixe-me Entrar” é um filme diferenciado, e por mais que não supere o original (nem chegue a ser tão bom quanto), pelo menos sabe que tipo de história quer contar, e acima de tudo, compreende que a força de sua trama não está no assustador ou no romântico, mas sim no drama melancólico de seus personagens.

Bom.
João Vitor, 19 de Dezembro de 2015.

Crítica originalmente publicada no site Pipoca Radioativa: http://pipocaradioativa.com.br/

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