Algumas histórias merecem ser
contadas, e a que dá origem a este Estrelas
Além do Tempo é uma delas. Pena que como cinema ela fique tão abaixo de seu
potencial e tenha dado origem a um filme tão convencional que é impossível de
não esquecer pouco tempo depois de tê-lo visto.
O roteiro escrito por Allison
Schroeder e Theodore Melfi conta a história real de três mulheres negras que
durante a corrida espacial (nos anos 60, enquanto ainda havia leis
segregacionistas em estados americanos) ajudaram a NASA a mandar voos
tripulados para o espaço e eventualmente para a Lua.
Escancarando sua pegada
hollywoodiana desde seus segundos iniciais, o filme acaba pecando justamente
por sua artificialidade e excesso de ironia dramática (quando o espectador sabe
algo que os personagens não), por exemplo: quando as personagens são auxiliadas
por um policial na estrada, uma delas comenta algo como “três mulheres negras sendo
ajudadas por um policial branco em Virgínia, 1961” – uma fala que obviamente
jamais teria acontecido de verdade e só serve para dialogar diretamente com o
espectador e tirá-lo do filme, além de mastigar sua discussão temática que já
poderia ter ficado clara apenas com as ações realizadas pelas personagens.
Além do mais, o roteiro ainda faz
questão de incluir algumas falas que chegam a dar vergonha alheia tamanha a
artificialidade, como “eu sou um judeu polonês cujos pais morreram em um campo
de concentração”, ou então (o meu preferido) “aqui na NASA, todos mijamos da
mesma cor”. Porém, o texto ao menos acerta em fazer com que a parte mais
técnica da história, que envolve matemática avançada, consiga não ser
entediante e soe convincente para o espectador, mesmo que ele não a entenda
completamente.
E se o diretor Theodore Melfi
(que já havia dirigido o fraquíssimo Um
Santo Vizinho, que tinha um ótimo elenco, mas problemas sérios de tom) erra
pela abordagem convencional e artificial (reparem como ele faz questão até de
dar um zoom na placa do banheiro que diz “apenas pessoas de cor”, como se o
espectador não pudesse identificá-la sozinho), ao menos acerta por ter um ótimo
timing musical (no que diz respeito às canções, e não a trilha instrumental) e
cria algumas sequências que, mesmo bobinhas, são bastante divertidas de
assistir. Além disso, as canções presentes ao longo do filme são sempre em
ritmos que trazem a representação do negro na cultura popular, como o soul.
Mas já a trilha instrumental
composta pelo lendário Hans Zimmer é completamente exagerada, intrusiva, e
melodramática, atrapalhando até mesmo bons momentos que poderiam ser muito mais
impactantes – como a cena que traz uma personagem discursando em um tribunal.
Os figurinos por outro lado
merecem créditos tanto por fazerem uma reconstrução de época eficiente quanto
por comentarem visualmente o deslocamento das personagens em seus ambientes de
trabalho, como ao trazer a protagonista vestida toda de verde enquanto todos os
outros no recinto estão completamente de branco.
O elenco também está entre as
coisas boas da obra. Enquanto Taraji P. Henson protagoniza o filme com carisma,
evocando empatia no espectador pela doçura exibida no relacionamento com as
filhas, Janelle Monáe é responsável por ótimos alívios cômicos e se diverte
imensamente, conseguindo ainda trazer uma vulnerabilidade tocante para a
personagem. Sendo assim, é uma pena que a atriz lembrada pelo Oscar para
concorrer como coadjuvante tenha sido Octavia Spencer, que, além de ser a mais
fraca das três, se limita a passar o filme todo arregalando os olhos e torcendo
os lábios na convicção de que essa expressão seja de alguma forma evocativa ou
engraçada.
Tendo também sua boa dose de
momentos nacionalistas exagerados, Estrelas
Além do Tempo conta uma história que deveria ter sido contada há muito
tempo, sobre figuras que infelizmente não recebem o reconhecimento e respeito
que merecem por conta da cor de sua pele. É uma pena então que uma história tão
importante seja contada em um filme tão convencional e sem nada de novo.
O. K. |
João Vitor, 9 de Fevereiro de 2017.
Crítica originalmente publicada no site Pipoca Radioativa: http://pipocaradioativa.com.br/
Crítica originalmente publicada no site Pipoca Radioativa: http://pipocaradioativa.com.br/
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