Um filme não precisa ser
eletrizante para ser bom, e Jackie é
a prova disso. Tendo um ritmo vagaroso, que em alguns momentos até flerta com o
entediante, o filme não deixa de ser um estudo de personagem interessante, que
conta com uma excelente atuação central em uma narrativa bastante sofisticada.
O roteiro escrito por Noah
Oppenheim acompanha a personagem título, a ex-primeira-dama Jacqueline Kennedy,
nos dias seguintes ao assassinato de seu marido, John F. Kennedy. A estrutura
do roteiro é bastante convencional: temos a protagonista dando uma entrevista e
conforme ela vai narrando ao repórter vemos em flashbacks suas memórias
envolvendo o assassinato e suas consequências para ela, mas o que é
interessante é que o filme não está interessado em fazer algo grandioso,
mostrando as consequências políticas em grande escala dos acontecimentos, e traz
uma proposta mais intimista, que se preocupa muito mais com o psicológico de
uma só pessoa – e nisso ele se sai incrivelmente bem.
A direção do chileno Pablo
Larraín (dos ótimos O Clube, No, e Tony Manero) é bastante competente e cheia de personalidade,
fazendo um bom trabalho ao diferenciar esteticamente os dois momentos em que se
passa a história: enquanto no “presente”, que mostra a personagem dando a entrevista,
ela aposta no convencional “plano e contra-plano” (mas com o diferencial de sempre
manter ambos os personagens no centro da tela), os flashbacks utilizam muito
mais steadycam (que dá a sensação de câmera “levitando”) que imprimem um
caráter mais fantasioso e inquieto. Outro acerto do diretor é não se render ao
melodrama com uma trilha sonora óbvia ou momentos artificiais em câmera lenta –
o momento mais forte do filme (aquele que traz a personagem se limpando do
sangue do marido), por exemplo, é filmado em close e depende quase que
inteiramente da performance de Natalie Portman, que merece aplausos tanto pela
intensidade com a qual se entrega à personagem quanto pelo primor técnico de
sua atuação (reparem como até mesmo sua dicção é calculosamente preparada para
emular o sotaque da Jackie verdadeira, sempre com as vogais mais abertas do que
o usual).
E enquanto a fotografia se
aproveita do fato de o filme de passar no inverno para evocar melancolia de
suas cores frias (sem contar os momentos sublimes como aquele que segue a
protagonista em um cemitério cheio de névoa, e que consegue ser ao mesmo tempo
triste e belo), a trilha sonora foge do convencional, que seria apostar em
instrumentos agudos como violinos, e utiliza quase sempre sons graves, como violoncelo.
Além disso, é interessante como as melodias constantemente fazem movimentos
decrescentes, partindo de uma nota mais alta e depois escorregando para uma
nota baixa – o que reflete o estado de espírito da protagonista que se sente pesada,
como se o mundo estivesse desabando em suas costas.
E são por esses primores técnicos
que Jackie acaba sendo tão eficiente.
Pode até ter um ritmo lento, mas se apreciado com atenção vai se mostrar um
filme sofisticado, delicado, e comovente.
Muito Bom! |
João Vitor, 26 de Fevereiro de 2017.
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