quinta-feira, 30 de julho de 2015

Crítica: Assassinato em Gosford Park, de Robert Altman



Robert Altman (1925 – 2006) é um cineasta pelo qual eu tenho um respeito muito grande, muito mais pela sua influência do que pelos filmes em si. Admito não ser fã de “Nashville (1975)”, embora goste de “MASH (1970)”, mas também tenho sérios problemas com “Quando os Homens São Homens (1971)”, tido por muitos (inclusive por profissionais que admiro) como uma obra-prima.



Mas independente do meu gosto pelas suas obras, o fato é que ele sempre soube o que estava fazendo, e tinha a capacidade de se manter no controle de sua narrativa mesmo em projetos que nas mãos de outros diretores estariam fadados ao fracasso. E muito mais do que isso, sua influência e importância inspiraram vários de meus diretores favoritos, destaque para Paul Thomas Anderson que em sua obra-prima “Magnólia (1999)” fez várias referências diretas à obra do Altman, e qualquer diretor que tenha influenciado, ainda que levemente, este que é um dos meus filmes preferidos, tem o meu respeito inquestionável.

Assassinato em Gosford Park se passa em uma casa de campo, onde vários membros da alta sociedade britânica, junto com seus serviçais, se reúnem para uma festa de fim de semana, e eventualmente, como o título brasileiro faz questão de adiantar, um assassinato acontece e todos viram suspeitos.

É fácil ler a sinopse do filme, ou apenas ouvir seu título traduzido (o nome original é apenas Gosford Park) e presumir que se trata de um típico suspense policial, onde todos os personagens são suspeitos e no fim o culpado é o menos provável deles.


Mas não se engane, o assassinato só acontece após metade do filme ter se passado, e mesmo quando ocorre não tem tanta importância assim. O filme é muito mais sobre os personagens e sobre a frágil camada de elegância que serve para esconder a podridão dentro deles. Nisto, é impossível não compará-lo ao excelente “Festa de Família (1998)” (foto ao lado), de Thomas Vinterberg, o filme que deu início ao Dogma 95 na Dinamarca, e tinha uma proposta similar.



Os inúmeros personagens de Gosford Park são muito bem desenvolvidos, e Altman consegue transitar pelos seus conflitos com total controle, como já havia demonstrado em vários de seus filmes anteriores. Mas ainda assim, o fato é que o número de personagens é muito alto, e por mais que sejam todos complexos, fica impossível se importar com seus destinos e escolhas, pois não conseguem gerar nenhuma empatia. E isso dá origem ao que é meu maior problema com o Altman: a frieza excessiva.

Eu não tenho problema nenhum com filmes frios, inclusive muitos de meus títulos preferidos têm a frieza como uma das características principais. Além disso, o já citado “Magnólia (1999)” tem como um dos fortes a capacidade de desenvolver simultaneamente um grande número de personagens. Mas Altman faz isso de uma maneira que chegou um ponto do filme em que eu já não estava me importando nem um pouco em relação ao que poderia acontecer com alguém, e nem me perguntando quem cometeu o crime e por quê.


Isso também me afetou muito em seus filmes anteriores. Em “Nashville (1975)”, eu passei duas horas e meia admirando a capacidade do filme de passar para o espectador o clima e o contexto em que vivem os personagens, mas sem conseguir sentir qualquer outra emoção. O mesmo vale para “Quando os Homens São Homens (1971)”, que tem uma trilha sonora incrível e um clima interessantíssimo e dificílimo de ser criado, mas que também não consegue causar o mínimo envolvimento emocional com a trama ou os personagens, o que é uma pena.


A primeira metade do filme se dedica basicamente à construção do clima e ao desenvolvimento e apresentação dos personagens. Já na segunda metade (após o assassinato), a trama vira um suspense policial clássico de “encontrar o assassino”, mas sempre funcionando dentro do contexto e das regras criadas pela primeira parte.

Nenhuma das duas metades é particularmente marcante. A primeira se prejudica pelo excesso de personagens, ainda que a narrativa seja bem conduzida, enquanto a segunda é menos interessante do que qualquer trama policial deveria ser, ainda que traga um ou outro bom momento.

Como um todo, Assassinato em Gosford Park é um bom filme, mas excessivamente frio, que se prejudica pelo seu excesso de personagens ainda que se preocupe em criar um cuidadoso clima.  É uma obra que pode ser admirada, mas em nenhum momento sentida.

O.K
João Vitor, 30 de Julho de 2015.

sábado, 25 de julho de 2015

Crítica: Homem Formiga, de Peyton Reed

              

     Homem Formiga

                         Novo filme da Marvel diverte, mas só.


Nos últimos anos a Marvel vem criando um enorme universo cinematográfico, formado pela união de várias franquias de diferentes super-heróis, onde cada novo filme é uma continuação não só da sua própria franquia, mas também do universo como um todo. Não deixa de ser uma manobra arriscada, tendo em vista que para aproveitar 100% os novos filmes você tem que ter visto um grande número de outros, inclusive de franquias em que você talvez não esteja tão interessado. Mas levando em consideração a bilheteria alcançada pelos filmes, não restam dúvidas de que isso vem funcionando, o que é compreensível já que nos últimos anos as franquias deram origem a filmes bem interessantes e únicos, como “Capitão América 2: O Soldado Invernal” e “Guardiões da Galáxia”. Mas também alguns esforços acabaram resultando em filmes medianos, que se enfraqueciam justamente pelo fato de se sentirem na obrigação de se encaixarem no universo criado pelos outros filmes. E é nesse segundo grupo que entra este novo “Homem Formiga”.



Talvez a maior dificuldade de cada novo filme de super-herói (principalmente para as franquias que estão começando agora) seja conseguir soar original, já que as principais “fórmulas” para criar heróis e, mais ainda, vilões, já foram utilizadas em outros filmes. Então quando logo nos primeiros minutos de projeção somos apresentados a um cientista (Michael Douglas) brilhante que se sente culpado pela perda de alguém querido e luta para que sua descoberta não caia em mãos erradas, um criminoso (Paul Rudd) que deseja deixar o crime para se dedicar à sua filha, e um homem ganancioso (Corey Stoll) que quer usar a tecnologia para enriquecer sem pensar nas consequências, podemos então perceber que não estamos diante de um filme particularmente original.


Mas isso acaba nem sendo um problema tão sério assim, já que desde o início o diretor Peyton Reed conduz a narrativa com total segurança, brincando muito bem com o gênero Assalto, e utilizando muito bem o 3D (principalmente nos momentos em que o herói está do tamanho de formigas), sem apelar para câmera tremida e sempre deixando claro para o espectador durante as cenas de ação o que está acontecendo e quem está aonde, algo que vem se mostrando uma grande dificuldade para novos diretores. Mas ainda assim, não posso deixar de imaginar o que Edgar Wright (que se demitiu pouco antes do início das filmagens devido a diferenças criativas) estava preparando, levando em consideração seus antecedentes (“Scott Pilgrim Contra o Mundo” e “Todo Mundo Quase Morto”) e sua facilidade em brincar com gêneros e elementos narrativos de quadrinhos. Mas é claro que isto também não diminui o trabalho de Reed, que é competente de qualquer maneira.


O elenco do filme é extremamente talentoso, mas infelizmente não é o bastante para encobrir as caricaturas que são os personagens (como apontei há dois parágrafos acima), mas fazem o que pode para fazer soarem genuínos os diálogos expositivos e a trama extremamente previsível.


Dentre os personagens, o maior erro é sem dúvidas o amigo do herói, Luís (Michael Peña), que é a caricatura do latino que já foi utilizada por Hollywood em inúmeros outros filmes. Além do mais, ele existe única e exclusivamente para alívio cômico, e ainda que protagonize alguns bons momentos (como quando conta ao amigo o enorme “telefone sem fio” que o fez ficar sabendo de determinado assunto), também é o responsável por muitas das piores piadas do roteiro, e o fato de ele ser o responsável pela última fala do filme, que imediatamente traz os créditos finais, faz com que o espectador saia da sala com um gosto amargo.


Mas talvez o principal erro do filme seja justamente a necessidade de se encaixar no universo Marvel e garantir futuras continuações, já que as ligações com os filmes anteriores soam gratuitas e tiram o foco da trama principal, e o filme inteiro parece servir apenas para apresentar os personagens de modo a poder usá-los nos próximos projetos de outras franquias. Muito provavelmente o resultado teria seria muito melhor se a trama se passasse em um universo paralelo e se preocupasse em se sustentar sozinha com bons personagens e uma premissa original, sem se preocupar com uma possível sequência.


Aliás, ao que tudo indica o Homem Formiga e mais alguns de seus principais personagens devem estar presentes nos próximos filmes da Marvel. Se o excesso de personagens já era um problema em Vingadores 2, Vingadores 3 está indo para um beco sem saída.

Mas apesar de todos esses problemas, “Homem Formiga” é sim um filme divertido. A narrativa é leve e agradável, as cenas de ação funcionam, e o clímax, mesmo que um pouco maior do que o necessário, é inventivo e consegue empolgar. Além do mais, Paul Rudd tem um talento cômico nato, algo que o filme explora muito bem, impedindo que a narrativa fique desnecessariamente artificialmente e densa.

Já a cena em que o herói encolhe pela primeira vez é, sem dúvida, um dos melhores momentos em 3D que em já vi no cinema. Aliás, as todas as cenas que trazem o herói em tamanho reduzido são de longe as melhores do filme.

As referências (tanto a outros filmes da Marvel quanto várias outras coisas) funcionam esporadicamente (destaque para a menção sutil à recente notícia de que o Homem Aranha vai se juntar aos Vingadores), mas em alguns momentos o filme faz questão de esticá-las até que percam à graça.



Mesmo se prejudicando pela necessidade de se encaixar no universo Marvel, “Homem Formiga” é um filme divertido e agradável, que sem dúvidas não irá decepcionar os fãs de quadrinho que aguardam ansiosamente cada novo filme de super-herói. Agora só resta torcer para que, assim como “Capitão América” e “Thor”, a franquia consiga melhorar em sua inevitável continuação.

P.S: A cena durante os créditos só existe porque já virou obrigação de todo filme da Marvel, já que o próprio filme já dá inúmeras pistas de aquilo iria acontecer. Já a cena pós-créditos nada mais é do que um “mini-tease-trailer” para o filme do Capitão América do ano que vem.

O.K

João Vitor, 25 de Julho de 2015.