quarta-feira, 1 de março de 2017

As surpresas do Oscar 2017

Hoje chegou ao fim a temporada de premiações com o a 89ª edição do Oscar e... UAU! Depois de uma cerimônia morna, com uma ou outra surpresa, mas no geral bastante previsível, tivemos justamente no prêmio final um momento inesquecível, que está entre as maiores surpresas da história da premiação e se tornou ainda mais marcante pela gafe sem precedentes que a acompanhou.
Mas comecemos do começo:

A noite se iniciou com um dos prêmios mais previsíveis (e merecidos) de todos: a vitória de Mahershala Ali como Ator Coadjuvante, em Moonlight. Logo na sequência, duas surpresas: enquanto Figurino estava divididíssimo entre Jackie e La La Land (eu particularmente apostava no primeiro) Animais Fantásticos e Onde Habitam se beneficiou da divisão de votos e garantiu a quarta estatueta para a veterana Colleen Atwood; logo na sequência Esquadrão Suicida desbancou o favorito Star Trek e levou Melhor Maquiagem (aliás, não deixa de ser irônico que em um ano com tantos filmes de super-herói, o único que leve o título de “vencedor do Oscar” seja justamente o mais criticado de todos). 

E se por um momento a premiação voltou para os caminhos previsíveis com a vitória de OJ: Made in America em Documentário (o prêmio mais merecido de todos), logo voltou a surpreender com as categorias de Som: enquanto A Chegada levou Edição de Efeitos Sonoros como “consolação” (que bom!!), “Até o Último Homem” bateu o favoritíssimo disparado La La Land em Mixagem – musicais sempre levam vantagem aqui e La La Land tinha tudo para levar o máximo de prêmios possíveis (aqui foi quando o filme começou a sugerir um perda de forças, mas nada que parecia ameaçar o prêmio principal). 

Na sequência, o prêmio mais previsível de todos: Viola Davis como Atriz Coadjuvante, e depois O Apartamento confirmou o prêmio político em Filme Estrangeiro – o que resultou em um dos melhores e mais significativos discursos da noite. Nas categorias de animação também ocorreu tudo como o previsto: Piper, da Pixar, venceu como Curta, e Zootopia, da Disney, como Longa. Direção de Arte para La La Land também estava entre os mais óbvios, assim como o de Efeitos Visuais para Mogli. Mas logo em seguida tivemos um grande baque para La La Land: sua derrota em Montagem (musicais que vencem Melhor Filme quase sempre levam esta categoria também) para Até o Último Homem (deveria ter ido para A Chegada, mas tudo bem). Curta metragem foi para Sing (que era o favorito ao lado de Ennemis Intérieurs) e Curta-Documentário para Os Capacetes Brancos, que era o franco-favorito. 

A partir daí, TUDO acorreu como esperávamos, e La La Land voltou a confirmar sua força e favoritismo, levando Fotografia, Trilha Sonora, e Canção Original. Como esperado, Manchester à Beira Mar levou Roteiro Original enquanto Moonlight levou Adaptado. Direção para Damien Chazelle, de La La Land, Ator para Casey Affleck (que superou sua inesperada derrota no SAG e confirmou o favoritismo) e Atriz para Emma Stone. Não restavam dúvidas de que o prêmio principal iria para La La Land, era um filme nos moldes da Academia, tinha vencido todos os principais termômetros, e vencido prêmios importantes no próprio Oscar (apesar das já comentadas inesperadas surpresas), e de fato venceu... por alguns minutos.

Em um erro de organização primário e sem precedentes (já houve gafes na cerimônia, mas nunca nesse nível), Warren Beatty e Faye Dunaway (duas lendas) receberam o envelope errado (é possível ver escrito “melhor atriz” no envelope enquanto Beatty o segura) que dizia “Emma Sotne – La La Land”, e após alguns momentos de hesitação desconfortável de Beatty, Faye Dunaway leu apenas o nome do filme, que, afinal, já era óbvio que iria vencer. Porém, em um raríssimo momento de surpresa absoluta na cerimônia, o vencedor era não era La La Land e sim o pequeno (em orçamento, não qualidade) Moonlight. Isso resultou num constrangimento enorme para a equipe de La La Land: subir ao palco, fazer discurso, mas ter que passar o prêmio para os outros. Aliás, foi belíssima a atitude de um dos produtores de La La Land ao perceber o erro e dizer que seria uma honra entregar seu prêmio para os colegas de Moonlight.

Tivemos então ao mesmo tempo uma gafe absurda e uma das maiores surpresas da história da cerimônia: um momento que será lembrado como um dos mais marcantes do Oscar. Uma pena que, querendo ou não, isso acaba por ofuscar a vitória importante de Moonlight: agora todos apenas comentam a gafe e poucos citam, por exemplo, que foi o filme com menor orçamento da história a vencer Melhor Filme, e é também o primeiro com temática “LGBT”.

Mas o que pode ter levado a essa surpresa? Simplesmente uma vontade de fugir do óbvio? As mudanças nas regras do ano passado, que resultou em vários membros novos, já afetou diretamente a votação principal? Seria uma vontade de espantar de vez a polêmica racial das edições anteriores? Ou então “justiça histórica” para Brokeback Mountain, que assim como La La Land venceu todos os principais prêmios da temporada, mas perdeu o Oscar por pura homofobia? (para quem não sabe, naquele ano muitos membros declararam publicamente que sequer iriam assistir a Brokeback Mountain por se tratar de um romance gay).

Enfim, essas são respostas que nunca teremos por definitivo, mas essas discussões são o que fazem do Oscar uma cerimônia tão divertida ainda em sua 89ª edição.

P.S: algumas curiosidades:

* Este foi o segundo ano consecutivo em que os prêmios de Filme, Direção e Montagem foram para três filmes diferentes. Antes do ano passado, a última vez que isso tinha ocorrido havia sido em 1982.
* O “Sound Mixer” Kevin O'Connell venceu por Até o Último Homem sua primeira estatueta depois de 20 indicações e nenhuma vitória!

João Vitor, 27 de Fevereiro de 2017.