sexta-feira, 20 de maio de 2016

Crítica: X-Men: Apocalipse, de Bryan Singer

Dentre as inúmeras franquias de super-heróis baseadas em quadrinhos, a melhor delas é sem dúvidas a dos X-Men. Isso porque além de filmes de ação e aventura competentes, suas tramas são sempre recheadas de personagens cativantes, que mesmo dotados de superpoderes, enfrentam dificuldades humanas como o preconceito e a auto aceitação. E ainda que este novo X Men: Apocalipse seja bem menos ambicioso do que seus antecessores do ponto de vista temático, ainda trata-se de um filme muito divertido, que agrada os fãs da saga e ainda se equilibra muito bem entre o sombrio e o cartunesco.


Ambientado nos anos 80, aproximadamente 10 anos após os eventos de X-Men: Dias de um Futuro Esquecido, o filme acompanha o professor Charles Xavier (James McAvoy) e seus alunos em sua luta contra o recém-despertado Apocalipse (Oscar Isaac), que pretende destruir a humanidade para construir um mundo apenas de mutantes.

O principal problema que o roteiro enfrenta é o excesso de personagens (algo que também atrapalhava o subestimado X-Men 3: O Confronto Final), afinal, todos os personagens importantes da saga estão de volta aqui, além de várias caras novas que desempenham papeis importantes. Isso acaba deixando o filme um pouco sem foco em sua hora inicial, parecendo não saber quem é seu protagonista.

O principal centro emocional do filme está em Magneto (em mais uma atuação excelente de Michael Fassbender), que protagoniza aqui uma das cenas de maior impacto dramático de toda a franquia. Mas como a duração é longa e há muitos outros personagens, Fassbender acaba aparecendo bem menos do que deveria, e isso o impede de se estabelecer como centro dramático do roteiro.

Já James McAvoy como Charles Xavier se prejudica por ter que protagonizar os momentos de humor mais desajeitados do filme (como a cena que envolve uma árvore destruída), além de uma subtrama artificial com a personagem de Rose Byrne (que parece estar no filme apenas para dizer diálogos expositivos).

E se a Mística de Jennifer Lawrence atrapalha um pouco por receber atenção demais apenas porque a atriz é uma grande estrela, os personagens “novos” (já presentes na trilogia original, mas agora em nova geração) acabam funcionando surpreendentemente bem. Jean Grey (vivida com inexpressividade por Sophie Turner) serve como centro dos novos personagens e ainda desempenha um importante e convincente papel no clímax do filme. Tye Sheridan como Ciclope se mostra à vontade nas cenas mais descontraídas, ainda que deixe um pouco a desejar nos momentos dramáticos. Já o Noturno (o jovem, mas experiente Kodi Smit-McPhee), além de ter uma das habilidades mais eficientes (teletransporte), funciona também como alívio cômico.



O mesmo não pode ser dito dos novos capangas do vilão, Tempestade (Alexandra Shipp), Psylocke (Olivia Munn) e Anjo (Ben Hardy). Ainda que este último seja o centro de uma das melhores cenas do filme (aquela ao som de “The Four Horsemen”, do Metallica), faltam a eles humanidade e arcos dramáticos (Tempestade até tem, mas não há tempo de desenvolvê-lo com o cuidado necessário). E enquanto Ben Hardy e Alexandra Shipp se resumem a uma sequência de apresentação e uma participação de ação no clímax, Olivia Munn nem isso tem.

O que nos leva, é claro, ao grande vilão e título do filme, Apocalipse, vivido pelo espetacular Oscar Isaac (de inúmeros filmes memoráveis, dentre eles Drive, Inside Llewyn Davis, Ex Machina, Star Wars: O Despertar da Força e O Ano Mais Violento). E o fato é que mesmo com um discurso genérico de “destruir o mundo”, o personagem acaba funcionando, já que acaba sendo uma ameaça real para os heróis – ainda que a conclusão do conflito (mesmo coerente) soe um pouco “fácil” demais. Vale dizer também que a atuação de Isaac é ótima, e o ator merece muitos créditos por conseguir soar ameaçador utilizando apenas a voz e o olhar, mesmo com uma caracterização física quase cômica.


A direção de Bryan Singer também merece destaque, principalmente por trazer eficientes sequências de ação, com uma violência cartunesca bem mais gráfica do que o usual (ainda que o excesso de CGI e a repetição de efeitos como o de objetos sendo transformados em pó incomode bastante), e ainda conseguir equilibrar bem o tom do filme entre o sombrio (destaque mais uma vez para a já citada cena dramática envolvendo Michael Fassbender) e o bem humorado (destaque para o visual colorido anos 80 dos vilões, e também para a participação de Evan Peters como Mercúrio, que é responsável pelas melhores piadas do roteiro).

Sendo um filme um pouco irregular, mas muito divertido e que faz jus aos seus antecessores, X-Men: Apocalipse não é muito ambicioso do ponto de vista temático, mas tem boas sequências de ação e um bem dosado senso de humor. E ainda que eu particularmente esteja cansado de tantas sequências entre os blockbusters americanos, em relação a esta saga só me resta dizer uma coisa: que venha o próximo filme!

Bom!


João Vitor, 20 de Maio de 2016.

Crítica originalmente publicada no site Pipoca Radioativa: http://pipocaradioativa.com.br/

Crítica: Capitão América: Guerra Civil, de Anthony e Joe Russo

Ao longo dos últimos anos poucos filmes da Marvel puderam ser classificados como menos do que razoáveis ou bons, mas também poucos puderam ser chamados de originais (talvez apenas Guardiões da Galáxia e Capitão América: O Soldado Invernal). Este novo Capitão América: Guerra Civil não tem nada de original ou inovador, mas ao menos prova que “mais do mesmo” pode até ser cansativo, mas se for bem feito pode voltar a divertir.


Ambientado pouco tempo depois dos acontecimentos de Vingadores 2: A Era De Ultron, o filme tem início com mais uma ação dos heróis que resulta em tragédia, o que leva as Nações Unidas a propor um acordo que limita a liberdade dos Vingadores, fazendo-os agir como ferramenta de governo. Mas enquanto Tony Stark se mostra favorável à ação, Steve Rogers não a aceita, o que eventualmente resultará em conflito entre ambos.

Talvez o principal mérito do filme seja humanizar as tragédias vistas nos filmes anteriores, dando alma a algo que até então era apenas um show de efeitos visuais. E justamente por isso, as motivações de todos os personagens ficam plausíveis e o roteiro foge da unidimensionalidade, deixando o espectador refletir e se identificar com todos os lados – entendemos a culpa de Tony Stark por todas as mortes que ele não pôde evitar, mas também entendemos a relutância de Steve Rogers, pois afinal, ele já foi usado como ferramenta de governo em seu primeiro filme e isso não acabou bem.

A direção é dos irmãos Anthony e Joe Russo (também responsáveis pelo ótimo Capitão América: O Soldado Invernal) e sua principal virtude são as cenas de ação. Mesmo que abusem de câmera tremida (o que também prejudica o 3D) e repitam algumas coreografias (em vários momentos, por exemplo, vemos personagens despencando de algum lugar alto batendo em diversos obstáculos até chegar ao chão), os diretores acertam por não exagerarem na dimensão dos conflitos (nada de prédios despencando e aviões caindo a todo o momento) deixando a ação mais crível, e sempre trabalhando muito bem a mise-en-scène, deixando claro o que cada personagem está fazendo e onde – também fazendo um uso eficiente e inventivo dos poderes e habilidades de cada um deles.


Como não poderia deixar de ser, o filme se prejudica um pouco pelo excesso de personagens, mas ao menos não se perde incluindo muitas subtramas. Dentre os personagens novos, os que mais se destacam é o Pantera Negra e, é claro, o Homem Aranha. E o fato de eles funcionarem tão bem até empalidece um pouco o fato de eles serem jogados na trama completamente do nada. E enquanto o Pantera Negra é o responsável pela minha sequência de ação preferida do longa, o Homem Aranha protagoniza seus momentos mais engraçados – e a referência que ele faz à um clássico do Cinema (não revelarei qual para não estragar a surpresa) é talvez o momento mais inspirado do roteiro. Aliás, destaque para o designe do uniforme do personagem, que o deixa com aparência juvenil e descontraída, ao mesmo tempo em que podemos perceber suas expressões (reparem nas mudanças no tamanho de seus olhos).


O elenco também está bem, ainda que um pouco irregular. Enquanto Tom Holland se diverte bastante como Homem Aranha, Daniel Bhürl (dos excelentes Adeus Lênin, Bastardos Inglórios e Rush) pende para a caricatura com seu vilão que só fala com a voz sussurrada e com uma expressão ameaçadora (ainda que o roteiro acerte em tornar suas motivações plausíveis). Já Robert Downey Jr. mais uma vez não traz nada de novo em sua interpretação no automático de Tony Stark, mas pelo menos seu personagem desta vez tem uma interessante e bem vinda complexidade dramática, e não se resume apenas a um alívio cômico.

Mas o filme também não deixa de ter sua boa dose de defeitos. O tom da primeira hora de projeção é estabelecido como sendo completamente melancólico e pesado, apenas para de uma hora para outra (com a entrada do Homem Aranha e Homem Formiga) passar a ser completamente engraçado e com piadas a cada minuto, e após o fim da principal sequência de ação do filme, o tom volta a ficar pesado e melancólico. Vale dizer que o clima de tensão criado é muito eficiente, e boa parte das piadas também funcionam, mas o problema é que a transição de um tom para outro é feita sem fluência nenhuma e sem qualquer justificativa narrativa (a sequência cheia de humor só está lá porque é o que se espera de um filme da Marvel).

Além disso, em questão de estrutura o filme se prejudica bastante por trazer seu principal combate faltando mais de meia hora para o fim da projeção, o que faz com que toda a sequência final se torne muito mais cansativa do que deveria, e os créditos finais sejam recebidos até com certa dose de alívio (a duração de duas horas e meia também não ajuda), principalmente porque o desfecho se acovarda ao não modificar completamente o universo criado até ali quando tem a chance – fazendo com que a tendência para o próximo filme seja de novo ser mais do mesmo.

Sendo um filme que vale o ingresso e diverte mesmo sendo cansativo, Capitão América: Guerra Civil mostra que a Marvel ainda tem medo de arriscar novos caminhos, mas cumpre seu papel sendo um bom filme que prova que “mais do mesmo” pode ser satisfatório quando bem feito.

Bom!

João Vitor, 28 de Abril de 2016.

Crítica originalmente publicada no site Pipoca Radioativa: http://pipocaradioativa.com.br/

sábado, 14 de maio de 2016

Crítica: O Conto dos Contos, de Matteo Garrone

“O Conto dos Contos” é um filme que mesmo com uma estrutura irregular acaba valendo muita a pena devido à sua originalidade e sua capacidade de equilibrar fantasia, suspense e comédia.


O roteiro acompanha três histórias de fantasia medieval simultaneamente: a primeira acompanha um casal de reis (John C. Reilly e Salma Hayek) que tentam vencer a esterilidade com um ritual envolvendo um monstro marinho; a segunda envolve outro rei (Toby Jones), sua filha prestes a se casar e uma pulga gigante; e a última também acompanha um rei (Vincent Cassel), que se apaixona por uma bela voz sem saber que esta pertence a uma velha.

Contando sua história muito mais através de imagens e construção de atmosfera do que de diálogos (o que pode incomodar os espectadores mais impacientes), o filme consegue ao mesmo tempo ser uma grande produção hollywoodiana de época, mas também uma obra mais pessoal, apostando em um senso de humor peculiar e uma atmosfera sombria.


Toda a parte técnica é impecável. O uso de locações dá ao filme uma grande tangibilidade (destaques para a cena passada no terraço do castelo e outra passada em um labirinto de pedra), e o designe de produção é eficiente em criar um universo fabulesco, que traz ao mesmo tempo o exagero e o glamour característicos das cortes medievais, e também interessantes toques sombrios com um peculiar senso de humor. Já a trilha sonora, além de utilizar constantemente instrumentos característicos da época, se equilibra apropriadamente entre o fantasioso e o sombrio.


O elenco também merece créditos, principalmente por não se renderem a caricaturas e convencerem mesmo interpretando personagens que se encaixariam em contos de fadas unidimensionais.

O único problema do filme é mesmo sua estrutura. Ao contar suas histórias praticamente paralelas ao mesmo tempo, o diretor impede um envolvimento maior por parte do espectador, pulando de uma trama para outra sem fluência alguma (e o fato da projeção durar mais de duas horas agrava o erro), além de não encontra um desfecho satisfatório para nenhuma delas. Talvez o formato de antologia (contando uma história de cada vez) pudesse ter funcionado melhor.



Tendo ainda diversos momentos marcantes (a cena que envolve um mostro marinho e outra que traz uma corda bamba sobre um precipício são minhas favoritas), “O Conto dos Contos” pode até se prejudicar pela sua estrutura, mas pelo seu universo peculiar consegue se estabelecer como um filme muito competente e acima de tudo original.

Muito Bom!

João Vitor, 14 de Maio de 2016.