terça-feira, 19 de dezembro de 2017

Crítica: Loveless, de Andrey Zvyagintsev

A primeira imagem que vemos em Loveless é uma paisagem toda coberta de neve. Alguns segundos depois, acompanhamos um personagem andando no meio de diversos galhos ressecados. São duas imagens que servem de síntese de um filme que ao longo das duas horas seguintes parece disposto a ir sempre para o caminho mais cruel, com personagens frios e secos.


Ambientado na Rússia atual, o filme conta a história de um casal que está prestes a se divorciar e entregar seu filho de 12 anos para um orfanato. Ao descobrir isso, o menino desaparece sem deixar rastros e eles têm que lidar com suas responsabilidades e egoísmos.

Este é um filme que odeia os seus personagens. É como se a própria narrativa tivesse nojo das figuras que retrata. A câmera é cúmplice de seus atos, mas também os julga e acusa. E até mesmo as cenas de sexo explícitas são filmadas com distanciamento e parecem não trazer alívio ou prazer nenhum para os envolvidos.

A fotografia de cores frias reforça o distanciamento e o julgamento do filme, que também não deixa de comentar sobre seu próprio país (a referência à Stalin e a cena que traz uma personagem correndo em uma esteira com uma jaqueta com a bandeira russa são especialmente significativas).

Ambientado em um mundo acostumado com respostas rápidas do Google, e onde as fotos postadas em redes sociais parecem ter mais importância do que os fatos em si (repare na insistência de uma personagem em tirar fotos superficiais de tudo), o filme ainda encontra momentos de surpreendente delicadeza, como quando vemos crianças brincando em um parque e logo em seguida percebemos que estamos vendo isso através de uma janela fechada, atrás da qual se encontra um personagem privado de qualquer tipo possível de felicidade.

Sendo brutal com as figuras que acompanha, mas demonstrando uma grande dose de empatia quando necessário, Loveless é um filme repulsivo, cheio de personagens irreparáveis e condenados em uma sociedade fria e sem rumo. É uma experiência densa e difícil, além de nada agradável. Mas como sua proposta é justamente incomodar, se mostra incrivelmente eficiente e inesquecível.

Ótimo!
João Vitor, 13 de Dezembro de 2017.

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