domingo, 18 de janeiro de 2015

Crítica: O Jogo da Imitação, de Morten Tyldum


O Jogo da Imitação

Roteiro pavoroso estraga o que seria uma interessante biografia


Alan Turing foi um grande matemático inglês, considerado o pai da computação moderna, que ajudou a decifrar os códigos de guerra nazistas e acabar com a Segunda Guerra. Além disso, passou parte de sua vida tentando se “curar” de sua homossexualidade, chegando a cometer suicídio em 1954. Dessa forma, é de se esperar que um filme baseado em sua vida tenda a ser, no mínimo, interessante, deixando espaço para um estudo de personagem e uma trama marcante. Infelizmente, esse não é o caso de O Jogo Da Imitação, novo longa-metragem do diretor Morten Tyldum, já que se trata de um filme esquecível, recheado de clichês, e que se sustenta apenas pelo talento de seus atores e pela sua curiosa premissa.

Baseado no livro Alan Turing: The Enigma, de Andrew Hodges, o filme mostra os esforços do matemático inglês (interpretado por Benedict Cumberbatch) para quebrar o código de guerra nazista e acabar com a Segunda Guerra, intercalando com alguns flashbacks mostrando a sua juventude, quando começou a se interessar por criptografia.

O roteiro de Graham Moore é extremamente burocrático e nada sutil, construindo personagens não convincentes e transformando até seu forte protagonista em uma caricatura. Em meu texto sobre A Teoria de Tudo (que pode ser lido aqui) elogiei o fato de o filme não tratar Stephen Hawking como um gênio inigualável, e mostrar de maneira convincente seus esforços, e mesmo que não entendamos seu raciocínio, suas façanhas soavam plausíveis. O mesmo não ocorre com O Jogo da Imitação, já que as conclusões de Alan sempre são bruscas ou mal justificadas, e para piorar, somos constantemente obrigados a ouvir clichês como “Tenho a impressão de que você vai ser bom nisso”, “Minha máquina irá vencer a guerra!” ou “Se você o demitir terá que nos demitir também”.

Os flashbacks envolvendo a juventude de Alan também falham ao tentar incluir peso dramático à narrativa, já que em nenhum momento conseguem criar um vínculo com o espectador, aparecendo de maneira quase aleatória durante o filme, soando mais como um melodrama dispensável, e esticando desnecessariamente a projeção. Para piorar, a interpretação de Alex Lawther, que faz o protagonista jovem, parece muito mais uma imitação de Benedict Cumberbatch do que uma versão menos madura do personagem.

A direção de Morten Tyldum é extremamente vazia e sem personalidade, se limitando a simplesmente ilustrar o (fraco) roteiro e confiando apenas no talento de seus atores para sustentar o filme. A única exceção é quando cria uma rima visual envolvendo as engrenagens da máquina de Alan e as rodas de um tanque de guerra, mas só.






As atuações merecem créditos por fazerem o possível contra os clichês do roteiro, destaque para Benedict Cumberbatch, que mesmo sendo obrigado a proferir falas quase vergonhosas, consegue fazer com que os conflitos de seu personagem soem reais. Keira Knightley também está bem, vivendo sua personagem com dedicação e a transformando em uma figura agradável, mas nada que justifique sua indicação ao Oscar.

Mas se tem algo em que O Jogo da Imitação acerta, é em sua reconstrução de época. Mesmo que o design de produção apele para alguns clichês, como a parede coberta de anotações pregadas, também merece destaque por criar ambientes convincentes, especialmente os pubs e o interior das casas, e incluir ótimos figurinos, que acertam por serem discretos, mas ao mesmo tempo comentarem sobre os personagens: Cumberbatch está sempre com peças cinza ou escuras, já Knightley sempre possui uma peça de cor viva, como o azul ou vermelho, já que se trata de uma personagem muito mais alegre do que o protagonista.


Possuindo ainda uma trilha sonora horrível (que acaba por evidenciar ainda mais a fraqueza do roteiro ao tentar, em vão, criar músicas empolgantes para acompanhar os feitos dos heróis, e melodias emocionantes para as cenas mais emotivas), O Jogo da Imitação se mostra uma experiência que se salva do fracasso apenas pelo talento de seus intérpretes e a força de sua história, mas falha ao povoa-la com personagens irreais e um protagonista caricatural que poderia ter sido marcante se não fosse o péssimo roteiro e a direção inexpressiva. No fim, ler a sinopse do filme causa mais emoção do que assisti-lo.

Regular.

João Vitor, 18 de Janeiro de 2015.

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