domingo, 26 de fevereiro de 2017

Crítica: Animais Fantásticos e Onde Habitam, de David Yates

Não é por acaso que a saga Harry Potter acumulou milhões de fãs pelo mundo inteiro. Além de trazer uma regularidade impressionante ao longo dos filmes (nenhum dos oito títulos poderia ser classificado como menos do que bom – algo raro em séries longas), a saga também foi apropriadamente amadurecendo junto com seus fãs e com seus protagonistas, e sempre soube que o que mais a diferenciava era seu universo fascinante e recheado de possibilidades. Desta forma, é gratificante ver que este novo Animais Fantásticos e Onde Habitam consiga ser um filme original ao mesmo tempo em que compreende que sua força está justamente em seu universo, construindo assim uma narrativa que mesmo com diversos momentos mais sérios e sombrios, não hesita em se entregar ao deslumbramento diante da magia que retrata.


A trama é bem simples e até difícil de fazer uma sinopse, basta dizer que o roteiro (escrito pela própria criadora deste universo, J. K. Rowling) acompanha o jovem britânico Newt Scamander (Eddie Redmayne), que chega a Nova York com uma maleta cheia de criaturas mágicas. Eventualmente algumas dessas criaturas escapam, e ele, com ajuda de novos amigos, precisa recuperá-las antes que elas possam chamar a atenção dos trouxas (ou não-bruxos, para quem não está acostumado com a série) e expor a existência do mundo da magia.

A direção é mais uma vez de David Yates, que comandou também os quatro últimos filmes da série Harry Potter (todos ótimos, sendo que dois deles (o sexto e o sétimo) estão para mim no top 3 da saga – Prisioneiro de Azkaban fecharia o pódio), e seu maior acerto aqui é conseguir trazer de volta o humor e, mais ainda, o deslumbramento que tanto marcavam os filmes anteriores. Assim, temos a todo momento a câmera praticamente flutuando ao acompanhar seus personagens (o que reforça a magia daquele universo), ainda que aqui ele deixe um pouco de lado as lentes grande angulares que marcavam os outros filmes. E se por um lado o 3D se prejudica pela quase total falta de cores, por outro, o diretor é feliz ao dosar muito bem o uso de câmeras subjetivas (aquelas que nos fazem ver através dos olhos de algum personagem) e usa de maneira moderada e eficiente truques como objetos voando em direção à tela, sem que para isso precise quebrar a lógica estética da fotografia (ao contrário do que acontecia em seu último trabalho, A Lenda de Tarzan).

Mas o que mais surpreende neste no filme é sua precisão em acertar seu tom. Como comentei anteriormente, a saga Harry Potter ficou marcada por ir amadurecendo conforme seu protagonista (e também seus fãs) crescia, sendo assim, enquanto nos primeiros filmes tínhamos um apelo mais infantil, os últimos capítulos eram completamente melancólicos e não hesitavam em abraçar o drama mais pesado (ainda que, mais uma vez, nunca tenham deixado de lado o humor e o deslumbramento inerente àquele universo). E este novo capítulo impressiona mais uma vez pela capacidade de equilibrar a ameaça e o assustador com o leve e o engraçado. Desta forma, se por um lado temos uma paleta de cores acinzentada e uma organização fanática religiosa totalmente macabra, por outro, temos vários momentos de um humor delicado e preciso (gosto particularmente das cenas que envolvem uma criatura que parece um ornitorrinco e que rouba joias), fazendo com que aquele universo seja cativante e divertido. E aqui a trilha sonora de James Newton Howard também merece aplausos, tanto por conseguir acompanhar as sequências de humor sem chamar atenção para si, quanto, principalmente, por utilizar de maneira discreta e pontual o famoso tema concebido por John Williams para incluir uma dose bem vinda de nostalgia e encantamento ao filme. Aliás, é mais do que apropriado que o tema possa ser ouvido pela primeira vez justamente ao vermos o personagem principal lançando o primeiro feitiço do filme.

O elenco também merece destaque. Eddie Redmayne cativa pela inocência de seu personagem, e seu carinho com as criaturas fantásticas são essenciais para a magia do filme. E Dan Fogler, mesmo sendo usado mais para alívio cômico, também se mostra importantíssimo não só pelo talento para comédia (gosto muito de sua reação espontânea ao ver Eddie Redmayne entrando em uma mala), mas também por representar alguém não habituado àquele mundo, sendo assim, sua reação de espanto e encantamento diante de toda aquela magia, de certa forma reflete os próprios sentimentos do espectador.

Já o roteiro de J. K. Rowling acerta por conseguir contar uma história independente ao mesmo tempo em que deixa ganchos para eventuais continuações, mas ainda assim, é necessário apontar que falta foco ao texto, tanto em relação aos personagens quanto, principalmente, à trama. Se por um lado o roteiro acerta por apostar em um dos temas secundários mais fascinantes da série anterior (o “mundo trouxa” vs “mundo bruxo”) e traz alguns subtextos políticos interessantes (algo que também era marcante em Harry Potter), a falta de uma trama principal e a indecisão em encontrar seu protagonista acaba deixando o filme bem mais irregular e longo do que o esperado.


Mas isso acaba sendo apenas detalhes diante de um universo tão cativante e bem representado. Como um todo, Animais Fantásticos e Onde Habitam vale muito a pena e diverte por compreender a força e a magia de seu mundo. Agora é só torcer para que os próximos volumes sigam o mesmo caminho e formem mais uma série memorável, mas por enquanto: com é bom estar de volta a este mundo!

Muito Bom!

João Vitor, 17 de Novembro de 2016.

Crítica originalmente publicada no site Pipoca Radioativa: http://pipocaradioativa.com.br/

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