sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Crítica: Jogo do Dinheiro, de Jodie Foster

Jogo do Dinheiro funciona muito bem em vários níveis diferentes, sendo um suspense envolvente, um drama interessante, uma ácida crítica à mídia descompromissada e à ganancia de milionários, além de também funcionar como um retrato de sua época.


 O roteiro segue um apresentador de TV (George Clooney) que é feito  refém ao vivo por um jovem (Jack O'Connell) que seguiu sua dicas para investir no mercado financeiro e perdeu todo seu dinheiro. Exigindo que a transmissão não seja interrompida, o rapaz tenta justificar sua ação ao expor as fraudes e imoralidades cometidas pelos donos de grandes corporações.

Dirigido com competência pela excelente atriz Jodie Foster, o filme é ágil não apenas em construir tensão (reparem em como a câmera vai lentamente ficando mais sorrateira na sequência inicial, até culminar com o apresentador como refém), mas também em gerar empatia com seus personagens – algo reforçado pela diretora ao constantemente posicionar sua câmera na direção oposta da câmera da TV do filme, ou seja, nos colocando no lugar dos dois personagens centrais ao nos mostrar o que eles estavam vendo (as câmeras e os bastidores do estúdio), o que aumenta a vulnerabilidade de ambos e facilita a identificação com o espectador.

O senso de humor do filme falha ao tentar provocar o riso de maneira exagerada (como no momento que envolve um personagem recebendo uma ligação em um momento inesperado), mas acerta nos momentos mais sutis (como na rápida piada envolvendo um elevador e outro que acontece após o personagem de Clooney perguntar “Quanto minha vida vale?”). Já a montagem é impecável, conseguindo acompanhar vários pontos de vista simultaneamente (os dois personagens ao vivo, os policiais planejando um resgate, a diretora do programa interpretada por Julia Roberts que tenta auxiliar Clooney a manter a calma, um grupo de hackers, um milionário que faz negócios imorais para aumentar seu lucro, e por aí vai...) sem nunca perder o foco e deixando claro que o centro da trama está nos dois personagens ao vivo na TV – o que é reforçado pelo montador e pela diretora ao nunca deixarem passar muito tempo sem que voltemos para eles.

O elenco também não deixa a desejar. George Clooney consegue fazer o espectador se importar com seu personagem mesmo enquanto este não passa de uma figura arrogante. Já Julia Roberts convence com a inteligência e segurança de sua personagem, que consegue manter a calma mesmo em uma situação extrema, além de passar com sutileza a informação de que se trata de uma personagem com anos de experiência (repare na casualidade rotineira e segura com a qual ela diz “boa sorte a todos” antes de o programa entrar no ar). Já Jack O'Connell talvez seja a maior surpresa do filme, sem nunca exagerar na raiva ou frustração de seu personagem (o que poderia deixa-lo mais unidimensional), o ator convence pelo seu drama e vulnerabilidade conforme a trama avança, ainda que a princípio possa parecer o vilão.


Mesmo exagerando um pouco mais do que o necessário em seu terceiro ato (com algumas revelações que parecem deixar claro para o espectador que aquilo é só um filme), Jogo do Dinheiro é um filme muito bom, que não apenas funciona como drama e suspense, mas também como ácida crítica à mídia e à ganancia cega de milionários, que são protegidos pelo mercado desregulado e contam com o apoio da lei para enriquecerem cada vez mais. Além disso, trata-se de uma obra que é um pleno retrato de sua época (a piadinha com memes no terceiro ato é sensacional) e que poderá ser revista daqui a algumas décadas para que possamos relembrar este começo de século XXI enquanto apreciamos um bom filme.

Muito Bom!

João Vitor, 26 de Maio de 2016.

Crítica originalmente publicada no site Pipoca Radioativa: http://pipocaradioativa.com.br/

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