sábado, 31 de dezembro de 2016

Crítica: O Bom Gigante Amigo, de Steven Spielberg

Responsável por pelo menos cinco filmes que podem ser classificados como irretocáveis, Steven Spielberg já gravou seu nome na história do Cinema. E por mais que sua tendência para o melodrama incomode bastante, principalmente em trabalhos recentes, sua capacidade de encantar e envolver com suas histórias é sempre algo a se admirar. Mas neste novo O Bom Gigante Amigo pouco se vê daquele cineasta que conseguiu em UM único filme fazer DOIS dos momentos mais lindos já filmados pro Cinema (a bicicleta voando em frente à lua e a despedida final em E.T: O Extraterrestre), já que se trata de um filme aborrecido e que só se salva do fracasso completo por pontuais momentos que valem pela inocência e pelo senso de aventura.


Baseado em um livro de Roald Dahl (mesmo autor de A Fantástica Fábrica de Chocolate e O Fantástico Sr. Raposo), o filme conta a história da órfã Sophie (a estreante – e ótima – Ruby Barnhill), que um dia conhece um amigável gigante (Mark Rylance), que sai às ruas à noite espalhando sonhos fabricados por ele mesmo. Os dois desenvolvem uma amizade, mas se veem ameaçados por outros gigantes, que querem devorá-la.

Como fica claro pela sinopse, o clima de conto de fadas e inocência é inerente ao filme, e Spielberg se mostra muito eficiente ao se divertir criando quadros que visivelmente remetem a ilustrações de livros infantis (como ao acompanhar as manobras do gigante para não ser visto durante a noite). Além disso, o diretor é mais uma vez eficaz em criar momentos onde o clima de aventura é pulsante e é impossível não se envolver (a cena que envolve alguns gigantes utilizando carros como patins e outra que traz a protagonista correndo pela casa do personagem título tentando se esconder dos vilões são meus favoritos).

Por outro lado, se Spielberg tinha demostrado em As Aventuras de Tintim (2011) que tinha uma impressionante noção de como utilizar o 3D em prol de uma experiência mais envolvente, aqui a tecnologia é completamente descartável, e ainda se prejudica pelo fato de o filme se passar quase todo durante a noite (vale lembrar que os óculos 3D já tendem a deixar a tela mais escura).

Ainda assim, o CGI é impressionante, não apenas ao criar os ambientes onde os gigantes vivem, mas também, principalmente, no trabalho de motion capture que permite dar humanidade às criaturas digitais. E mesmo que a atuação de Mark Rylance possa soar um pouco unidimensional ao exagerar no “bom-mocismo”, o fato é que o ator é eficiente no que o personagem pede, e consegue transbordar fragilidade e bondade (mas confesso que o dialeto criado para os gigantes, cheios de erros de concordância e neologismos, me cansou muito conforme o filme avançava).

Já a trilha sonora de John Williams é eficiente em criar um clima de fantasia, mas peca muito pelo excesso, sendo praticamente ininterrupta o filme inteiro, o que se torna cansativo e ainda “anestesia” o espectador para o momentos onde a música é realmente necessária.

Mas se a primeira hora e meia do filme conseguem até conquistar pela inocência, mesmo não sendo muito original e tendo alguns excessos, o mesmo não pode ser dito da meia hora final, onde o filme praticamente naufraga e deixa quase que completamente de lado o clima de fantasia criado até então para tentar achar um desfecho apostando na comédia, e o resultado é uma das piores coisas que eu vi no cinema em muito tempo.

Mudando seu tom literalmente de uma cena para outra, o filme gasta uma longa sequência apenas para fazer um humor bobo e imaturo, onde acompanhamos por pelo menos dez minutos um jantar envolvendo o gigante e outras pessoas em tamanho normal, e as piadas se resumem a ele cuspindo um chá e encharcando quem está por perto, e o clímax cômico da sequência envolve (sério!) cachorros peidando.


Pecando ainda por um clímax decepcionante e um desfecho completamente conveniente e sem preparo algum (onde personagens que acabaram de se conhecer viram amigos de longa data), O Bom Gigante Amigo tem um certo charme inocente que é interessante, mas é um filme longo demais e completamente aborrecido, que mesmo criando empatia com seu personagem título, acaba sendo um dos piores filmes da carreira de Spielberg. Não chega a ser um desastre total, mas passa perto.


Regular.

João Vitor, 29 de Julho de 2016.

Crítica originalmente publicada no site Pipoca Radioativa: http://pipocaradioativa.com.br/

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