domingo, 25 de dezembro de 2016

Crítica: Porta dos Fundos: Contrato Vitalício, de Ian SBF

O grupo Porta dos Fundos está sem dúvidas entre as melhores coisas do humor brasileiro atual. Mantendo uma impressionante regularidade ao longo de seus 4 anos de existência, o grupo consegue através de suas breves esquetes fazer um humor ácido e inteligente, contando ainda com atores de ótimos timings cômicos e grande talento para humor físico. E agora com seu primeiro longa metragem, o grupo prova mais uma vez seu talento, embora demonstrem dificuldade em adaptar a linguagem de internet para o Cinema.



O roteiro, escrito por Fábio Porchat e Gabriel Esteves, começa acompanhando o diretor Miguel (Gregório Duvivier) e o ator Rodrigo (Fábio Porchat) que ganham um importante prêmio no Festival de Cannes e no meio da comemoração assinam, em um guardanapo de bar, um contrato que os obrigam a sempre trabalharem juntos. Mas logo em seguida Miguel desaparece misteriosamente retornando apenas 10 anos depois, falando coisas sobre abdução alienígena no centro da Terra e disposto a gravar um filme sobre essa experiência. E eis que Rodrigo, agora um ator de sucesso, se vê obrigado a participar dessa produção, mesmo contra sua vontade.

Utilizando a trama apenas como uma desculpa para criar personagens absurdos e situações inusitadas, o filme acerta ao aproveitar uma das coisas que o grupo tem de melhor: a capacidade de trazer personagens que divertem pelo exagero de suas personalidades.

Sendo assim, o único personagem que poderia ser classificado como “normal”, e que funciona para gerar identificação com o espectador, é justamente o protagonista (vivido com talento por Porchat, que demostra um ótimo humor físico, mas também convence ao passar de maneira sutil os sentimentos de seu personagem) e todos os outros poderiam facilmente ter saído de uma das esquetes do grupo: Luís Lobianco vive um assessor obcecado por mídia, Marcos Veras é um “repórter” de revista de fofoca, Thati Lopes é uma “blogueira fitness” que “vloga” o tempo todo, Julia Rabelo é uma preparadora de elenco psicopata, e por aí vai...

Conseguindo se divertir como o nosso constante vício em tecnologia e tirando sarro desde filmes cults até grandes produções genéricas (“— Assinou sem ler? Deve ser assim que o Adam Sandler faz tanto filme bosta” diz Duvivier em um dos melhores diálogos do roteiro), o filme tem diversos momentos inspirados (a cena que envolve uma coletiva de imprensa em várias línguas daria uma excelente esquete, e o diálogo que traz a fala “... ele é filho de um semideus do fogo com uma prostituta do Piauí” é algo que só o grupo poderia criar), ainda que também tenha sua dose de momentos desajeitados (a cena que traz os dois personagens principais recebendo um prêmio no início da projeção é particularmente sem graça).

Mas o principal problema é que o filme não se sustenta como Cinema. Se durante mais de uma hora é possível se divertir com o absurdo dos personagens, chega uma hora que isso não é mais suficiente, e como a história que está sendo contada não tem absolutamente nada de marcante, a reta final da projeção acaba sendo repetitiva e cansativa – algo indesculpável em uma comédia.

Trazendo o humor ácido e inteligente já característico do grupo, Contrato Vitalício é um filme que diverte por um bom tempo, mas aborrece em sua reta final. Consegue trazer coisas interessantes das esquetes, mas também mostra que o Porta dos Fundos ainda tem um longo caminho para dominar a linguagem do Cinema como dominam a do Youtube.

Regular.

João Vitor, 3 de Julho de 2016.

Crítica originalmente publicada no site Pipoca Radioativa: http://pipocaradioativa.com.br/

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